domingo, outubro 04, 2009

Rio: realidade e ficção

Tenho visto muita gente falando no Twitter a respeito do Rio, por causa da escolha como sede das olimpíadas de 2016. Várias pessoas ironicamente sugerindo a indicação do vídeo oficial da campanha como melhor curta de ficção no Oscar. E muitas outras comentando como o Rio está em "estado de sítio", da violência que toma conta das ruas, ou fazem a velha piada das novas modalidades olímpicas no Rio, que seriam engraçadas se já não fossem recontadas desde a época da campanha Rio 2004 (antes da web 2.0, portanto).


O vídeo da campanha


Pois bem. Não sou do tipo que não entende que uma coisa é piada, portanto o que vou dizer aqui não tem a ver com os tweets irônicos em si (mesmo com os sem graça). Mas reconheço que me incomodo com o fato de algumas pessoas realmente acharem que só de pisarem no Rio de Janeiro estão assinando uma sentença de morte. Tem gente que acha mesmo que é preciso desviar de balas perdidas e cadáveres quando se anda nas calçadas, que ir à praia é pedir pra sofrer um arrastão ou que se andar sozinho no ônibus vai inevitavelmente ter uma arma apontada na cara. Nada mais absurdo.

O fato é que o vídeo da campanha não é menos real (ou "mais ficção", se preferir assim) do que a impressão que se tem de que o Rio é a capital da violência, terra sem lei. Tudo o que foi exibido no vídeo acontece diariamente na paisagem carioca. Não era preciso nem encenar (exceto os anéis olímpicos na praia, claro). O Rio é uma cidade linda, culturalmente rica, de um povo alegre e cordial, multifacetada, cheia de lugares e coisas interessantes para ver. A violência é um problema grave e real, sim. Mas não é, como muitos são levados a pensar, algo que tome conta da vida do carioca, a não ser, infelizmente, da parcela da população que vive em zonas de conflito de tráfico. O medo, a sensação de insegurança, estes sim tomam conta de nossas vidas. A causa deste medo são os episódios reais de violência a acontecer conosco, com nossos amigos e vizinhos (mais frequentes do que se pode aceitar, mas menos do que se imagina de fora) e a louvavelmente ampla, embora algumas vezes sensacionalista, cobertura da imprensa.

Dados da mais recente pesquisa sobre violência no Brasil mostram que, entre 2004 e 2006, a média proporcional de homicídios no Rio de Janeiro (44,8 por 100 mil) foi menor do que a de 204 outras cidades, sendo quase metade das de Foz do Iguaçu, Recife, Vitória e Macaé, e surpreendentemente menor do que Belo Horizonte, Cuiabá e que a minha querida Niterói, que considero tão segura. É quase o mesmo índice de Curitiba. Inaceitável? Sim. Coisa do outro mundo, milhas distante da realidade dos demais grandes centros urbanos brasileiros? Não, infelizmente.

O mesmo relatório mostra um elevado índice de homicídios na população jovem (102,2 por 100 mil), o que tem uma explicação: grande parte dos homicídios no Rio são relacionados a conflitos de tráfico de drogas. Não achei statísticas nacionais sobre assaltos, mas garanto que a média do Rio é comparável com a das outras capitais e grandes centros brasileiros (se alguém achar os dados, me manda o link por favor). Enfim, o Rio não é muito diferente da cidade onde (pela probabilidade) você mora.

Concluindo: sou a favor de se fazer piada sobre tudo e o exagero caricatural faz parte do humor. Mas que não se confunda piada com realidade.